Rafael Galvão

Um pouco de nada, e nada de muito importante.

domingo, fevereiro 29, 2004

Maria Rumbeira

         Quando descobri o blog do Adenor Gondim me apaixonei por esta foto.
         Deixo que o próprio Adenor a descreva:
Na feira de Junco, município de Jacobina-BA, numa tarde de maio de 1984. No meio da feira, num espaço de 5 m2, um pau em cada canto, uma lona em volta, uma bancada-palco, Tonho do Acordeon & Maria Rumbeira. Casa cheia, 20 espectadores disputando um melhor lugar para ver e se possível tocar em Maria. Hoje o ingresso seria R$ 1,00 por cabeça para uns 15 minutos de show. Era proibido tocar em Maria sob pena de ser expulso do espetáculo. Quando a sanfona parou tinha apenas 14 espectadores.

         Há fotos mais belas no blog do Adenor, ou pelo menos esteticamente mais adequadas ao gosto do mundo. Mas essa foto, pelo menos para mim, conta uma história vívida que, se não é exatamente típica, é pelo menos uma faceta bastante reconhecível da história de tantos e tantos sobreviventes no sertão.
         Pelas roupas, pela atitude, pode-se dizer que Maria Rumbeira é prostituta em um cabaré qualquer do interior da Bahia, de Pernambuco ou do Ceará. De qualquer lugar. Porque o sertão nordestino é o contrário do Brasil, é o paraíso da homogeneidade. O tal caldeirão cultural brasileiro não existe ali, uma terra árida que gera gente ensimesmada e rústica, chamada por Euclides da Cunha de "o verdadeiro paulista". E por isso é impossível saber quem é Maria Rumbeira. Ela pode ser mulher de Tonho do Acordeon, pode ser sua funcionária, pode ser uma das partes de uma protocooperação da qual ambos se beneficiam: ela traz ouvintes para ele, ele traz clientes para ela. Talvez essa seja a graça a história que a foto de Maria Rumbeira conta: ela pode ser qualquer história que se queira imaginar.
         De que interessa que sua barriga denuncie pelo menos um parto? Seu olhar compenetrado enquanto dança mostra a seriedade com que defende seu pão. Sua roupa cafona é um arremedo de music hall -- um retrato da pobreza que se espelha no luxo do showbiz que ela via no Chacrinha, um conceito digerido pelo seu ambiente e pelos seus padrões e transformado em sensualidade sertaneja e grosseira.
         A história de Maria, pelo menos nessa foto, está para sempre ligada à de Tonho do Acordeon. É engraçado pensar que no começo ela era provavelmente apenas um chamariz para Tonho do Acordeon, um homem que provavelmente começou a tocar acordeon profissionalmente na década de 70 e, naquele momento, via seu público minguar graças à chegada das rádios FM e das tevês. Para Tonho, Maria inicialmente era um acessório; mas a vida é engraçada e as pessoas devem ter passado a ver Tonho apenas como o sujeito que tornava possível a dança de Maria.
         Seus espectadores não enxergam a arte que há no show, até porque provavelmente não há nenhuma. Para eles, Tonho do Acordeon é apenas um pretexto para verem uma mulher que julgam sexy -- e que, veja o olhar dela, concorda com eles -- dançar sensualmente. 1984, de certa forma, ainda era um ano de inocência no interior. E Maria Rumbeira era um signo de sensualidade numa sociedade machista, ainda ingênua e respeitadora. Era a Gretchen que estava ao seu alcance, e em quem um rápido toque valia a pena de uma expulsão.
         20 anos depois dessa foto, Maria Rumbeira provavelmente não dança mais e não corre as cidades do interior em dias de feira. Está casada, é mãe solteira, trabalha numa venda, é puta barata para caminhoneiros sem dinheiro, é qualquer coisa. Tonho, provavelmente, continua tocando sua sanfona -- talvez agora com uma mulher mais nova e, quem sabe, na qual se possa tocar durante o show que, não por acaso, dura 15 minutos.

sábado, fevereiro 28, 2004

Igreja Rafaélica de Todos os Tostões

         Eu tenho um sonho.
         Não é um sonho onde as pessoas não sejam julgadas por sua cor, porque esses sonhos bonitinhos eu deixo para o Luther King .
         Meu sonho é fundar uma igreja.
         Ela já tem até nome. Igreja Rafaélica de Todos os Tostões. Tem também um slogan: "A salvação a preços módicos".
         E antes que as más línguas venham falar de eventuais semelhanças com a igreja do Bispo Macedo, vou avisando que não há nenhuma. Para começar, eu serei cardeal. Cá para nós, "Cardeal Galvão" soa bem.
         A obreiros e fiéis, a Igreja Rafaélica de Todos os Tostões oferecerá a salvação. Você nos dá o seu dinheiro -- inclusive aquele que você guardou na meia, pão duro safado; pensou que podia esconder dinheiro do Pai? -- e nós lhe damos a salvação. É justo. A salvação de sua alma pecadora vale mais que o dízimo. E se você não aprendeu a dar, como espera receber? Primeiro a gente mete a mão no seu bolso, depois te mete no Paraíso.
         Os céticos, essa raça ímpia incapaz de ver a pureza e a verdade d'alma, podem alegar que Jesus oferece a salvação de graça. É. Pode ser. Mas na Igreja Rafaélica de Todos os Tostões você fala com o dono, cara a cara, olho no olho. Você quer falar com Jesus pessoalmente, quer? Pois é. Achei que não. A Igreja Rafaélica de Todos os Tostões oferece a salvação com certificado de garantia -- e se você não a conseguir, pode voltar do Além e falar com o Cardeal Galvão que ele te dá o dinheiro de volta.
         Mas nem só dos assuntos de Deus a Igreja Rafaélica de Todos os Tostões se ocupará. Porque somos evangélicos mas temos algo de católicos, e acreditamos que a obra do Senhor se realiza aqui, quando estendemos a mão aos nossos irmãos carentes e os ajudamos a seguir em frente com dignidade. As boas ações é que nos levam ao Paraíso.
         A Igreja Rafaélica de Todos os Tostões se dedicará à santa obra de ajudar aqueles menos favorecidos pela Providência, aqueles a quem precisamos dar as mãos no esforço de criar um mundo mais solidário.
         E nossa obra social começará por mim. E não venham vocês alegarem que é malandragem, porque não é. Como você espera que o Cardeal Galvão se dedique à evangelização se tem que se preocupar com coisas de somenos importância, como a sua sobrevivência com um padrão mínimo de dignidade?
         A nossa obra social começará por mim porque eu ando carente.
         Eu ando carente de um Jaguar, com motorista surdo-mudo.
         Eu ando carente de um apartamento pequeno, coisa de 300 m2, no Faubourg Saint Germain. E de outro, ainda menor, na Via Vêneto.
         Eu ando carente de um Lear Jet.
         Eu ando carente de uma casa na Riviera Italiana (com vista panorâmica para o Mediterrâneo porque eu preciso de um ambiente bucólico para pensar em tão espinhosos assuntos teológicos; aquela que aparece em "A Condessa Descalça", com sua praia particular, serve) e de um castelo no Vale do Loire, daqueles que já vêm com título de nobreza.
         Cacete, eu ando carente de tantas coisas que só de pensar nelas dá vontade de chorar.
         E é tão pouco.
         Por isso a Igreja Rafaélica de Todos os Tostões. Porque precisamos estender as mãos uns aos outros. Precisamos de um mundo mais justo, e o Cardeal Galvão é o líder que vai nos levar em direção à Luz -- e, graças às suas contribuições, agora sem que a Light a corte por falta de pagamento.

Super-heróis

         Piada do dia: minha irmã recebe um convite de formatura. Nele, a formanda agradece aos pais e louva o modelo de honestidade que eles representaram para ela. Honestidade.
         Quanto à mãe eu não sei. Mas conheço seu pai. É comprovadamente corrupto, condenado por isso. Chamá-lo de ladrão não dá processo.
         Mas o que seria de nós sem os filhos para nos ver como melhores que a realidade?

A literatura moderna

         O Bia acha que as regras do Elmore Leonard para literatura são válidas para a literatura moderna.
         Aí é que tá, Bia. Acho que a graça -- e a ruína -- da literatura moderna é o fato de ela praticamente não ter regras que desçam a esse ponto de minúcia. É curioso imaginar que Joyce, Mann, Proust e Hemingway (embora eu ache este último uma fraude) fazem "literatura moderna", e não há nada em comum entre eles.
         Mas a lista de Leonard é praticamente um manual de estilo. O que ele preconiza é típico da cultura americana com seus "cursos de criação literária", em que há um modelo razoavelmente rígido para que se escreva a great american novel. Diz respeito a um tipo de técnica narrativa específica, aquela americana derivada de Hemingway e às vezes com raízes remotas na Bíblia do Rei James via Faulkner, e hoje em dia menor na minha não tão humilde opinião. Faz muito tempo que não vejo nada de realmente brilhante na literatura americana -- o que inclui derivados do noir como Leonard, e também, citando aleatoriamente, William Kennedy, Malamud e todos os outros.
         Acho que a literatura americana, no conjunto, é a mais importante do século passado: muito bons escritores em um curto período de tempo e em um espaço bem delimitado. Mas isso se deve a um período específico, entre os anos 20 -- com Fitzgerald e Hemingway, por exemplo -- e os 50, com a última grande explosão criativa, a literatura beat. Era uma literatura forte, pulsante, o melhor retrato de um país que explodia em força econômica e criativa, com a absorção de levas gigantescas de imigrantes.
         Mas ela definhou faz tempo, e hoje vive da repetição de clichês e de pequenos não-eventos de marketing. Pode ser ignorância minha, mas não conheço nenhum grande romance americano que tenha sido lançado nos últimos 20 anos. Muitos bons livros, claro, mas nada que você coloque na estante com a sensação de que acabou de ler um par de Proust ou Joyce.
         A lista de Leonard, no final das contas, estabelece as regras da mediocridade (entendida como mediana, ou comum). Se Joyce seguisse as regras de sua época não escreveria "Ulysses". Proust não teria escrito "No Caminho de Swann". Porque todo mundo estaria escrevendo igual a algum modelo que, àquele momento, tentava sacudir o mofo de cima de suas regras recém-criadas.

sexta-feira, fevereiro 27, 2004

A decadência que nos espera

         Eu estava em Paris, engolindo aquele "continental breakfast" intragável que servem por lá e que só se salva pelo café, melhor que o que se toma aqui.
         Foi quando entrou no restaurante do hotel uma família de americanos: pai, mãe e casal de filhos adolescentes.
         Eram brancos e louros, aquele branco-louro lavado e insosso. Eram feios, típicos americanos médios, e não sei se era por terem acordado naquele instante ou por uma vida de tolerância compulsória, mas pareciam evitar dirigir a palavra uns aos outros. A menina, de seus 14 anos, eu só pude definir como "lambisgóia"; nunca uma palavra foi tão adequada alguém.
         Se sentaram na mesa e começaram a comer. A menina pegou uma tigela e encheu de sucrilhos e leite. Até a borda.
         Devem ter esquecido de lhe contar que talheres servem para levar a comida à boca, porque ela afundou a cara de cavalo na tigela e começou a comer. Segurava a colher como quem segura um facão, com firmeza, decidida a não perder a batalha contra aquela desconhecida. À essa altura eu já tinha deixado o meu café esfriar e olhava para ela sem conseguir controlar a queda progressiva de meu queixo.
         Quando os sucrilhos acabaram, ela deve ter sentido uma imensa pena em desperdiçar todo aquele leite. E então levantou a tigela e, com a sem-cerimônia de um asno em seu côcho, bebeu sofregamente o leite.
         A danada não deixou cair uma gota. Quando acabou limpou a boca com as costas da mão. Ela estava satisfeita. Esperei um arroto que não veio.
         Pela primeira vez tive uma noção clara do que me esperava, eu vassalo de um império disfarçado e tosco. E pensei em ligar para minha mãe e reclamar que, em vez de ter me dado boas maneiras, ela devia era ter ido me parir nos Estados Unidos. Porque lá eu poderia ser um porco, mas não me incomodaria porque aos donos do mundo educação não é pedida.

A vingança dos normais

Nos últimos anos eu vinha ouvindo um ditado engraçadinho que só não era mais chato que os óculos de quem contava.
         "Trate bem o nerd, porque ele será seu chefe amanhã."
         Agora, anos depois, tenho o prazer de sugerir à nerdada que seus dias de glória estão acabando.
         O ápice do nerdismo se deu quando houve a última grande ruptura tecnológica, graças à tecnologia da informação, e aquela classe antes desprezada por qualquer pessoa que tivesse um mínimo de traquejo social alcançou uma posição de importância desmedida. De humilhados na sala de aula, de vítimas de trotes sem graça, o pessoal das risadinhas esquisitas sobre assuntos sem graça foi alçada à posição de -- Deus me perdôe -- modelos sociais.
         Mas em um mundo cheio daquilo que o Peter Drucker chama de "técnicos da informação", ser nerd traz cada vez menos vantagens. É ser mais um na multidão. É disputar o mesmo mercado com gente normal cujos conhecimentos técnicos se aproximam cada vez mais dos deles.
         O mundo está voltando ao seu lugar, e nós também. Não vamos mais ter que agüentar bobões vestidos de Darth Vader. Não vamos mais ter que ouvir explicações filosóficas sobre a Enterprise. Não vamos mais ter quer ler notícias como esta. "Zen e a Arte de Manutenção de Motocicletas" vai voltar a ser só um livro chato.
         A vingança dos unnerds se aproxima.

Redatores de arte

         Lendo um post do Fabio no Stereo Screaming, vi uma expressão perfeita: "redator de arte".
         Se entendi bem, quer dizer o seguinte: um diretor de arte que, por força das circunstâncias, acaba fazendo as vezes de redator. O contrário também se aplica aos pobres redatores, seres infelizes que à noite sonham com clientes monstruosos e suas canetas castradoras, que na falta de coisa melhor aprendem a se virar com o Illustrator, o Corel Draw! e o Photoshop.
         É comum em agências pequenas. É a pior coisa que pode acontecer. É a melhor, também.
         É a pior porque distrai, porque o sujeito acaba se dedicando 50% a cada área -- isso quando não dedica mais tempo àquela que não é a sua, como tentativa de surprir suas deficiências. O resultado raramente é o melhor possível. Fica sempre a impressão de que poderia ter sido melhor, de que nem o texto nem o layout ficaram satisfatórios. Além disso, acaba faltando aquela interação entre a dupla de criação (ah, não dá para resistir: dupla de criação, segundo o Dorinho, é composto de um homem que pensa e um diretor de arte...). Quando é uma dupla bem azeitada, o resultado é sempre maior que a combinação dos dois.
         Ao mesmo tempo, é a melhor porque força o sujeito a ser um criador melhor, mais completo.
         Resumindo, é bom ser um redator de arte. Mas só durante um tempinho.

quinta-feira, fevereiro 26, 2004

Mais uma brilhante teoria rafaeliana

Como você já deve ter notado, eu tenho um passatempo desajuizado. Consiste em contradizer teorias elaboradas por gente mais preparada que eu, gente que dedicou horas infindáveis a estudos e pesquisas sobre o assunto, usando pouco mais -- ou pouco menos -- que o senso comum.

Senso comum é uma coisa perigosa. Foi ele que fez com que acreditássemos por milênios que a Terra era o centro do universo, quando não era sequer o centro de um sistema solar de quinta ou sexta grandeza.

Essas contra-teorias que elaboro surgem do nada, talvez pelo que muita gente identifica como uma forte tendência minha de "ser do contra".

Por exemplo, li há algum tempo, em algum lugar, que uma pesquisadora chegou à conclusão de que o português falado hoje no Brasil era mais parecido com o falado em Portugal em 1500 do que o que se fala por lá agora.

Segundo ela, o Rio só sujaria os ss porque, depois de séculos isolada, ainda falando como se falava em Portugal 3 séculos antes, foi invadida pelo "novo português" em 1808.

Eu discordo.

O Brasil sofreu mais influências linguísticas do que Portugal. Houve os índios, em primeiro lugar. E os grandes responsáveis pelo estabelecimento do português como língua nacional foram os escravos africanos, que divididos em uma série de nações e idiomas foram obrigados a utilizar a língua do opressor. Sem contar os muitos imigrantes de nacionalidades diversas, que variavam de acordo com a região -- italianos em São Paulo, alemães no sul, espanhóis na Bahia.

O mais provável, pela lógica, é que o Brasil tenha sofrido mais influências desses falares diversos do que Portugal.

Uma das evidências de que o português brasileiro foi o mais modificado está no fato de que as únicas cidades litorâneas (não se deve esquecer que o Brasil, até há pouco tempo, só existia de verdade no litoral) que sujam os ss -- como os portugueses -- são o Rio, Salvador e Recife; duas delas falam "dje". São justamente essas que mantiveram maior contato com Portugal ao longo da história colonial. O Rio sujaria mais porque foi invadido por Dom João e seus sicofantas, sofrendo uma espécie de volta às raízes.

Assinado: Rafael Houaiss, seu criado.

O Evangelho segundo Elmore Leonard

         Elmore Leonard tem uma lista de 10 erros que se pode cometer ao escrever literatura.
         Veja só:

1. Never open a book with weather.
If it's only to create atmosphere, and not a character's reaction to the weather, you don't want to go on too long. The reader is apt to leaf ahead looking for people. There are exceptions. If you happen to be Barry Lopez, who has more ways to describe ice and snow than an Eskimo, you can do all the weather reporting you want.


Conheço pelo menos um escritor que invarialmente abre seus livros assim, gente que o mundo vem lendo há séculos. Mas Leonard, claro, é melhor que ele.

2. Avoid prologues.
They can be annoying, especially a prologue following an introduction that comes after a foreword. But these are ordinarily found in nonfiction. A prologue in a novel is backstory, and you can drop it in anywhere you want.
There is a prologue in John Steinbeck's ''Sweet Thursday,'' but it's O.K. because a character in the book makes the point of what my rules are all about. He says: ''I like a lot of talk in a book and I don't like to have nobody tell me what the guy that's talking looks like. I want to figure out what he looks like from the way he talks. . . . figure out what the guy's thinking from what he says. I like some description but not too much of that. . . . Sometimes I want a book to break loose with a bunch of hooptedoodle. . . . Spin up some pretty words maybe or sing a little song with language. That's nice. But I wish it was set aside so I don't have to read it. I don't want hooptedoodle to get mixed up with the story.''


         Por que Leonard não contou isso para Balzac? Assim o pobre Honoré evitaria começar seus livros com prólogos que duram até várias páginas. E seria um escritor tão bom quanto Leonard.

3. Never use a verb other than ''said'' to carry dialogue.
The line of dialogue belongs to the character; the verb is the writer sticking his nose in. But said is far less intrusive than grumbled, gasped, cautioned, lied. I once noticed Mary McCarthy ending a line of dialogue with ''she asseverated,'' and had to stop reading to get the dictionary.
4. Never use an adverb to modify the verb ''said'' . . .
. . . he admonished gravely. To use an adverb this way (or almost any way) is a mortal sin. The writer is now exposing himself in earnest, using a word that distracts and can interrupt the rhythm of the exchange. I have a character in one of my books tell how she used to write historical romances ''full of rape and adverbs.''


         Meu Deus, e todos aqueles escritores que achavam estar fazendo um grande trabalho ao escrever os tais outros verbos? Dickens, seu merda!

5. Keep your exclamation points under control.
You are allowed no more than two or three per 100,000 words of prose. If you have the knack of playing with exclaimers the way Tom Wolfe does, you can throw them in by the handful.


         Bem, nisso ele tem razão, na minha opinião. O ponto de exclamação é o crachá da incompetência.

6. Never use the words ''suddenly'' or ''all hell broke loose.''
This rule doesn't require an explanation. I have noticed that writers who use ''suddenly'' tend to exercise less control in the application of exclamation points.


         De repente, não mais que de repente, Vinícius de Morais é um incompetente.

7. Use regional dialect, patois, sparingly.
Once you start spelling words in dialogue phonetically and loading the page with apostrophes, you won't be able to stop. Notice the way Annie Proulx captures the flavor of Wyoming voices in her book of short stories ''Close Range.''


         Acho que foi Hemingway quem disse que toda a literatura americana descende de "Huckleberry Finn". Dat's right. E o livro é praticamente todo escrito em dialeto escravo. Mas como se sabe, Leonard vai deixar uma impressão muito mais duradoura na literatura americana que Mark Twain.

8. Avoid detailed descriptions of characters.
Which Steinbeck covered. In Ernest Hemingway's ''Hills Like White Elephants'' what do the ''American and the girl with him'' look like? ''She had taken off her hat and put it on the table.'' That's the only reference to a physical description in the story, and yet we see the couple and know them by their tones of voice, with not one adverb in sight.


         Não é que esteja errado. Tampouco está certo. A questão é que esse item finalmente demontra a razão de ser dessa lista: Leonard quer que todos os escritores do mundo escrevam como ele. Direito dele.

9. Don't go into great detail describing places and things.
Unless you're Margaret Atwood and can paint scenes with language or write landscapes in the style of Jim Harrison. But even if you're good at it, you don't want descriptions that bring the action, the flow of the story, to a standstill.


         Leonard deveria ter lido "O Pai Goriot" com mais atenção. E veria que a descrição da pensão de Mamãe Vauquer, ou a descrição do quarto do pai Goriot em comparação aos de suas filhas, são fundamentais para a compreensão do espírito da história. Mas talvez ele tenha razão, já que é um escritor muito, muito melhor que Balzac.

10. Try to leave out the part that readers tend to skip.
A rule that came to mind in 1983. Think of what you skip reading a novel: thick paragraphs of prose you can see have too many words in them. What the writer is doing, he's writing, perpetrating hooptedoodle, perhaps taking another shot at the weather, or has gone into the character's head, and the reader either knows what the guy's thinking or doesn't care. I'll bet you don't skip dialogue.


         Tem razão. A questão é saber que partes são essas. E se o sujeito sabe, certamente não está preocupado com a lista de Leonard.

Uma certa falta do que dizer

         Meus hábitos de internet são meio malucos.
         Eu checo regularmente 5 contas de e-mail, 3 delas várias vezes por dia. E para isso uso dois programas. Para o mail diário uso o Eudora, ainda o melhor cliente, principalmente para malucos que como eu guardam tudo o que recebem, com exceção de newsletters; ele manipula anexos com uma transparência e flexibilidade que nenhum outro produto oferece. Para as duas contas que só recebem newsletters uso o Mozilla Thunderbird, porque elas não permitem mais de cinco checagens diárias. Se permitissem, eu usaria só o Eudora.
         Tenho 3 browsers instalados. O que realmente uso é o Mozilla, natural para quem usou o Netscape desde a versão 2.02. É, disparadamente, o melhor. Uso o Explorer exclusivamente para me conectar ao Velox, no Rio, e para postar no Blogger.br (que tem uma incompatibilidade séria com o Mozilla).
         Para escrever estes posts uso o w.bloggar, que embora não poste diretamente no Blogger.br me permite contornar a deficiência crônica dos servidores da Globo (aqueles que dizem que você passou muito tempo sem mexer no blog, isso quando você acabou de entrar) e ainda facilita a inclusão de links e tags HTML.
         Curiosamente, o blog é melhor visualizado no IE do que no Mozilla. Ao mesmo tempo, a cor original dos textos (cinza) só aparece no Mozilla. Em alguns computadores há um problema com visualização da fonte (Georgia, que se você quiser pode baixar aqui), mas pelo que vi não é nada de tão grave.
         Durante muito tempo usei o ICQ -- meu UIN é um remoto 693217, bem longe dos 8 ou 9 dígitos de agora. Mas acabei admitindo que o MSN Messenger é muito mais prático e simples, e há muito tempo não uso o ICQ.
         Ainda uso algumas velharias como o CuteFTP, e ainda guardo um cliente Gopher, embora não sirva mais para nada. Para compartilhamento de arquivos uso dois programas: o iMesh, razoável para músicas isoladas, e o eMule, o melhor para álbuns inteiros, filmes e programas. Entretanto, é preciso paciência com este último.
         Meu novo xodó é o NewzCrawler. Depois que descobri o RSS, é a minha forma preferida de ler blogs e notícias. Ainda é cheio de feeds que trazem apenas sumários, mas com o tempo ele vai se restringir a feeds completos. Acredito que mais cedo ou mais tarde o RSS vai se tornar fundamental; mas nem mesmo eu confio nas minhas previsões.
         E pensar em 1990 eu não fazia idéia de que ia depender tanto de um computador.

quarta-feira, fevereiro 25, 2004

Vem, Totó, vem...

         Do Amorous Propensities:
Dr. Melvyn Greenberg said: "An intact male dog has no pheromonal or odoriserous attraction towards a human female. The male dog has no inherent desire for sexual copulation with a human female.
(...)
He said a male dog cannot be changed to perform sexual intercourse with a human female. The dog would have to be masturbated, held under appropriate restraints and forced by a human to enter a female vagina. A minimum of six men would be required for such an exercise.

         Resta dizer três coisas.
         A primeira é que, em relação a esse tipo de uso de cães, não é o pênis que interessa.
         A segunda é que na Inglaterra vitoriana, onde o homossexualismo masculino era crime -- como bem sabia Oscar Wilde --, o lesbianismo era "liberado". A razão era simples: a rainha Vitória não acreditava que duas mulheres pudessem fazer aquilo.
         Terceira: alguém lembrou de avisar isso para os Yorkshires das senhoras de Copacabana?
         Quarta (eu não aprendi matemática no colégio): cachorros podem não gostar de mulheres, mas são fissurados numa perna.

A 8 mil pés acima do nível do mar

         Normalmente eu entro no avião, sento na minha poltrona e esqueço do mundo. Se tem alguma coisa para ler, eu leio. Se estou sentado à janela, olho para fora. Raramente abro o computador. Raramente durmo. Raramente converso com alguém. Não tenho muito interesse e, quando meu companheiro de viagem tem, não demora muito para que sua polidez seja desestimulada pelos meus monossílabos.
         Mas ainda lembro da senhora que voltou de Aracaju comigo, para o Rio.
         Era sua primeira viagem de avião. Não sabia como apertar o cinto de segurança, não sabia como chamar a aeromoça, não sabia nada. Eu a ajudei com o cinto e a ensinei a reclinar a poltrona. E talvez por isso, e pelo nervosismo, ela tenha resolvido que eu seria seu confidente durante aquelas próximas horas.
         Ela era de Brejão, um povoado de um interior remoto chamado Brejo Santo ou Brejo Grande, não lembro. Tinha morado cerca de 20 anos no Rio, onde deixara uma filha.
         Ela estava maravilhada, porque nunca tinha viajado de avião porque achava que era caro demais. Agora que ela sabia que o preço era acessível, só iria viajar de avião. Contou toda a história de sua vida; naquela época ela, além da pensão do INSS, descolava um troco comprando terrenos e vendendo um pouco mais caro.
         Era uma mulher interessantíssima, pela vitalidade e pela simplicidade -- não aquela simplicidade acanhada, mas uma mulher que estabeleceu um pacto com a vida: ela sabia exatamente como é o mundo, mas não deixava que isso lhe incomodasse.
         Ela me contou até o motivo de sua viagem: ia fazer uma operação de hemorróidas. Não sei em que isso poderia me interessar, mas tive que me controlar para não rir. Não era difícil, na verdade.
         Aproveitei para iniciar aquela senhora nos meandros da contravenção. Ela ficou tão encantada com o lanche a bordo -- é preciso ser um neófito para se encantar com a comida vagabunda que as empresas aéreas servem hoje em dia -- que queria levar tudo, talheres e pratinhos, para casa.
         Não seria eu a contar a ela que isso não se faz.

Mamma África

         No começo de 2000 uma matéria na Veja me deixou ao mesmo tempo fascinado, curioso e estupefato.
         Ela contava que a Somália tinha, simplesmente, colapsado. Não havia mais Estado. O país tinha chegado à anarquia absoluta.
         Nos últimos dez anos a Somália tinha sido sinônimo de fome e de caos; era mais ou menos o tempo que se passou desde que perdeu seu governo central.
         A reportagem falava com pessimismo sobre sua situação. Nos últimos tempos pequenos enclaves de poder vinham se organizando dentro do seu território, onde clãs conseguiram se impor. Eram como pequenas cidades-estado -- que pouco a pouco iam se formando.
         E era isso que me maravilhava, me espantava e me deixava com a sensação de que sou testemunha de tempos maravilhosos.
         A África vem revelando tantas tragédias nos últimos anos que todo o mundo praticamente admite não saber se há uma solução possível. Aids, Ebola, guerra civil com requintes eventuais de canibalismo, tudo isso sai de lá. Mas a solução estava na cara de todos, e a reportagem não via isso.
         Qualquer pessoa sabe que a grande tragédia da África foi o colonialismo. A Europa dominou várias regiões e estabeleceu divisões administrativas a seu bel-prazer, pouco importando a história e as etnias daquela região. Como exemplo, em Ruanda juntaram tribos rivais que hoje se massacram mutuamente.
         Quando o modelo se esgotou e as colônias conseguiram sua independência, herdaram essas fronteiras e composições étnicas artificiais. Mais que isso, herdaram uma cultura que não era a sua. Não se respeitou o processo de formação histórica daqueles povos, que saltou etapas e pulou da Idade da Pedra para um regime democrático que eles não criaram nem jamais conseguiram assimilar totalmente.
         Ao descer ao fundo do poço, a Somália finalmente começava a arrumar a casa. Jogava para o alto toda a história da colonização e recomeçava do nada.
         Era um processo fascinante, com muitos pontos em comum com a formação dos Estados nacionais europeus após a queda do império romano: fracionamento da unidade original, formação de pequenos Estados de poder reduzido. Acima de tudo era um processo que poderia restaurar as configurações prováveis das nações africanas, retomando o curso da história de um continente que culturalmente ainda tem muito de pré-histórico. As nações que se formariam teriam assim uma base consensual e, finalmente, legítima.
         É um processo que se estendeu por mais de 1000 anos na Europa, mas que poderia se desenrolar em algumas décadas na Somália. Na sua desgraça, ela estava apontando o futuro.
         E foi ao notar isso que percebi a maravilha destes tempos em que vivemos. A multiplicidade de um mundo que pode ser tudo, menos um só.

terça-feira, fevereiro 24, 2004

Skindô ou a morte da democracia

         Eu não agüento mais ouvir os deslumbrados (adequadamente pagos para isso, é bem verdade) dizerem que o carnaval da Bahia é democrático.
         O carnaval baiano não é democrático desde que o primeiro bloco estendeu uma corda separando seus foliões da massa ignara, estabelecendo uma hierarquia e roubando do povo sua invenção. E hoje, com a ditadura dos trios, esse mesmo povo é obrigado a pagar para pular -- ou então se espremer no espaço que resta, se tornando causa e efeito da violência.
         Aos poucos, o que resta do carnaval de rua do Rio -- justamente o que sempre foi considerado o mais elitista -- vai se tornando mais "democrático" que o baiano.
         E, para quem gosta dessa festa, sempre resta o carnaval de Olinda.

Confusão teológica

         Esta notícia (via Amorous Propensities, link ao lado) me deixou pensando se, afinal de contas, eu não estava errado quando escrevi, há algum tempo, que católicos são menos infensos às diatribes oficiais da religião que os fiéis de igrejas protestantes.
         Pensei muito. Acho que uns 30 segundos.
         E continuo achando que sim. Os católicos americanos, por menos que queiram, no fundo são protestantes. E talvez os católicos brasileiros, no fundo, sejam pagãos selvagens incapazes de alcançar a Salvação.

A arrogância da ignorância

         Ultimamente andei pensando em algumas coisas sobre a ignorância e a burrice, esses valores eternos e ubíquos.
         A burrice em si não incomoda, porque independe da vontade de cada um. Pode ser politicamente incorreto, mas não tenho nenhum problema em achar alguém um burro incorrigível. Isso não faz alguém melhor que os outros, nem a mim melhor que alguém que acho burro (por conseqüência, alguém que me ache burro tem que fazer o mesmo...). Eu mesmo faço parte desse contingente miserável em muitos aspectos -- muitos mais do que gostaria. Pelos mesmos motivos, admito prontamente que há excesso de ignorância no mundo.
         Mas como diz Humbert, o esteta pedófilo de Nabokov, tenho muito orgulho do pouco que sei para ser humilde pelo muito que não sei. E talvez seja por isso que o que chamo de "arrogância da ignorância" consiga me tirar do sério.
         É quando a ignorância se manifesta em todo o seu esplendor sulfúrico, quando se espalha como uma metástase. Ela tem orgulho do nada que é, e não admite contradição. É o pior da humanidade, é o que atrapalha o progresso, é o orgulho pelo prato de farinha que faz desprezar sem conhecer as porções harmoniosas da nouvelle cuisine.
         Setembro de 2002: conversando sobre a loucura que tinha se apropriado do mercado financeiro -- dólar nas alturas, risco Brasil lá em cima, inflação ameaçando estourar. A minha interlocutora era taxativa: isso é Lula, e quando aquele comunista se eleger vai ser pior.
         Tentei argumentar que aquilo era só um movimento especulativo, que era apenas o mercado aproveitando uma chance de ganhar um trocado, que não tinha nada a ver com medo do sapo barbudo -- ou melhor, que Lula era apenas o motivo encontrado, e que aquilo iria acabar assim que o resultado da eleição saísse, fosse qual fosse.
         Mas a ignorância, quando se assume em sua glória, basta em si própria e não dá ouvidos a nada. E então veio a carteirada: "Eu sou economista!".
         Pensei em lembrar que era uma economista burra, mas brigar para quê? Pelo menos a história me deu razão.
         São essas coisas que conseguem, às vezes, me tirar do sério. É alguém insistindo comigo que os Beatles gravaram "Asa Branca", que Lennon foi assassinado pela CIA, que ET's foram avistados e abduziram algum maluco, coisas desse tipo. As pessoas têm o direito de ser ignorantes; todos somos, em maior ou menor grau. Mas porque têm direito a ter anéis não quer dizer que possam tomar todo o braço: e a ignorância deve continuar calada, quieta, se o contrário implica em querer contradizer a verdade.
         Não reconheço direitos humanos para a ignorância. E não há sequer SUIPA para aquela ignorância que em seus recalques se revolta contra o que acha ser "demonstrações desnecessárias de sapiência". Primeiro porque é preciso admitir que deve haver um padrão para as coisas, e esse não é o da ignorância. Segundo porque ela geralmente está errada, e vê erudição onde há só um pouco de informação. Acontece que seus padrões são muito baixos para diferenciarem Rubem Fonseca de Kant. Esquecem como é fácil tomar equivocadamente informação por cultura. E em seu complexo de inferioridade se revoltam contra isso, porque lhes falta inteligência para distinguir as coisas.

segunda-feira, fevereiro 23, 2004

Felacity

No Panamá, mais exatamente na província de Chiriqui, há uma cidade chamada Boquete.

Dizem que os panamenhos de lá têm o péssimo hábito de falar de boca cheia.

Carnaval, duas da manhã

Duas da manhã e eu tenho que procurar um lugar para comer.

Na lanchonete onde me sento os balconistas estão assistindo ao desfile da Viradouro. Passo a conversar com um deles sobre as usinas de açúcar em Sergipe, sua importância como berço de cidades, e fico conhecendo um novo verbo: "pejar". É quando as usinas param sua produção, durante quase metade do ano.

E então aparece Dercy Gonçalves, de perna para cima.

Os outros balconistas se amontoam em frente à TV.

-- Olha a calçola dela! Ela tá arreganhada! Ah, velha safada!

Um deles comenta:

-- Mas mesmo velha, tem gente que ainda pega.

Imediatamente o outro acrescenta:

-- Ele tá dizendo que ele pega.

-- Pego mesmo! Se der mole na minha frente, eu pego mesmo!

A conversa continua. Quando me despeço, o valente me pede um cigarro.

-- Ei, amigo, me arranja um desses pr'eu torar mais tarde.

("Torar" é um verbo sergipano, provavelmente oriundo de estourar, que originalmente significava quebrar, mas que hoje serve para qualquer coisa. Pode ser comparado à gíria "detonar". Um psicanalista faria a festa com o que essa palavra conta sobre a psique masculina nordestina.)

Eu dou o cigarro; e junto dou um conselho.

-- Olha, cá para nós, é melhor torar a Dercy do que um cigarro.

E ele concorda, em meio a gargalhadas.

Bem vindo a Sergipe.

Observando os nativos

Já devia ter comentado antes, mas sempre é tempo.

Se alguém quer conhecer Aracaju sob a ótica de um carioca -- e o olhar de um estrangeiro é sempre mais acurado, como bem sabia Camus -- é só dar uma passada em Aracaju News.

É o blog de um carioca, o Leonardo, sobre a sua experiência em Aracaju, ainda recente e cheia de surpresas. E é muito interessante.

domingo, fevereiro 22, 2004

Ai, meu Deus, como é bom

Antes tarde do que nunca. Chamada da revista Enfoque de agosto do ano passado, destinada ao público evangélico:

Sexo e prazer no casamento
Pesquisa revela que casais evangélicos são liberais, adotam sexo oral e são motivados a buscar maior satisfação sexual no casamento


Ahn... Será que perguntar pelas bundinhas é perguntar demais?

Tripudiando em rubro-negro

A principal razão para eu gostar de futebol não é exatamente amor ao esporte.

É que o futebol e suas paixões exaltadas me permitem um dos mais gostosos esportes que conheço: debochar do perdedor.

Não basta vencer, tem que tripudiar.

Minha família é flamenguista. Há gerações torcemos pelo Flamengo, temos Zico tatuado em nossos corações. Mas uma irmã resolveu ser palmeirense. Não adianta lembrar a ela que não podemos nos rebaixar torcendo por um time cuja camisa tem cor de catarro, um time que covardemente mudou de nome durante a II Guerra, que ultimamente só pode se orgulhar de ter subido para a primeira divisão. Ela tomou essa decisão tresloucada, fazer o quê? A juventude tem o direito de cometer suas besteiras.

Resta me dedicar ao doce esporte de ser profundamente chato e irritante. Rir do Palmeiras como rio do Botafogo, do Vasco, do Fluminense. Rir como rio do desplante de torcedores do Sport quando insistem que foram campeões brasileiros porque o Flamengo se recusou a jogar com um time da segunda divisão em 1987. (Torcedores do Sport: não interessa o que vocês acham. O Vasco, o Fluminense e o Botafogo reconhecem o campeonato, e isso é o que importa.)

Tudo isso é chato? É, sim. É muito chato. Para muita gente é insuportável. Não ganho prêmios de popularidade por esse hábito deplorável.

Mas ultimamente esse esporte não anda compensando. A emoção que o Flamengo tem nos dado é a expectativa, as promessas e os despachos nas encruzilhadas para que consigamos sair da zona de rebaixamento. E, se me dedico a ser desagradável nas épocas de vacas gordas, ao menos admito que não há oportunidade melhor para me devolverem toda a encheção de saco na qual alegremente embarco sempre que o Flamengo ganha um jogo.

Posso ser chato, mas não sou injusto.

E posso ser justo, mas não sou burro: este post estava escrito há algum tempo, mas esperei o Flamengo voltar a ganhar um semi-título para publicá-lo.

Mais pesquisas

Pesquisa de uns malucos americanos (não, não são ingleses) afirma que pessoas com personalidade hostil ou agressiva nascem com tendência genética para fumar.

E eu que sempre pensei ser um doce de pessoa.

sexta-feira, fevereiro 20, 2004

Poema muito do enjoadinho

Falando sério
eu não gosto
de poesia moderna
As pessoas parecem pensar
que basta dividir frases
ao meio
e esquecer a pontuação
para automaticamente
criar um poema.

Poesia é outra coisa.

Poesia não é divã
de analista
não é competição
de domínio do vernáculo
poesia não é
nada disso.

E certamente, meu amigo
poesia não é isto aqui
Isto é apenas prosa
formatada para tentar
mostrar o engodo
que é a maior parte
da poesia moderna.

Cordeiro vestido de lobo

Tem coisas que, contando, ninguém acredita.

Um rapaz bem, digamos, "moreno" foi parar em um evento neo-nazista no Arizona usando uma camiseta em que estava escrito "White Power".

E não era provocação. Ele falava sério. Ele realmente acredita na supremacia branca.

Foi gentilmente convidado a se retirar do lugar -- racistas podem ser gentis com os inferiores que lhes lambem as botas -- e teve seu dinheiro devolvido.

A mãe desse menino devia tê-lo enchido de porrada quando ele era criança. Porrada mesmo, daquelas que fazem vizinhos chamarem o juizado de menores. Assim talvez fosse poupada da vergonha de ver o nome de seu pai em tamanho imbecil.

Episódio de uma noite de verão

O sujeito se aproxima de mim com um sorriso.

-- Eu podia pedir uma ajuda ao senhor? É que eu preciso de dinheiro para voltar para casa, meus filhos estão com fome...

Me mostra um papel que não olho. Enquanto abro a carteira para lhe dar 1 real, ele pede:

-- Pedir não é vergonha, né? Por favor, não fique com raiva.

-- Se eu ficasse com raiva não te dava o dinheiro.

Enquanto me afasto ele me faz uma sugestão bem intencionada:

-- Por que o senhor não pára de fumar? Fumar faz mal.

E então, por breves instantes, eu penso em tomar o real que lhe dei.

quinta-feira, fevereiro 19, 2004

Afundando o Titanic

Eu assisti a "Titanic". Duas vezes. Nas duas, fui para fazer companhia; saí do cinema impressionado com o artesanato brilhante do filme e com o clichê que era o seu roteiro, e fazendo comparações injustas com "Encouraçado Potemkim".

Mas da segunda vez, de saco cheio por estar ali, precisei recorrer a pequenos estratagemas para suportar as quase 3 horas de filme.

Perto do final há uma cena melosa -- mais que a média -- em que uma mãe coloca seus filhos para dormir sabendo que é a última vez. Corta para o navio praticamente na vertical, com as pessoas despencando e se estabocando nas ferragens navio abaixo.

Fiz minha própria sonoplastia: "Ai! Ui! Ai, aí não! Plaft! Ploft!"

Do meu lado uma menina de seus 11 anos, em prantos, me olhava com todo o ódio de que uma criança é capaz.

Acho que naqueles poucos segundos destruí naquela menina quaisquer vestígios de fé no gênero humano.

Ah, que saudades da universidade

De Giovanna Bartucci (psicanalista e ensaísta, membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae; é assim que ela assina), analisando o cinema de Almodóvar em um ensaio publicado na D.O. Leitura chamado "Almodóvar ou o desejo como universo":

O "fato fílmico" nasce, então, do filme feito, definido como um discurso significante localizável. Em outras palavras, o fato fílmico abrange a construção das imagens, a condução expressiva do relato, o desempenho dos atores, ou seja, tudo aquilo que confere ao texto que daí resulta o estatuto de discurso.

Acho que ela quis dizer o seguinte: um filme é um filme.

Mas o melhor mesmo são algumas das outras partes do ensaio:

Talvez devamos, de, fato, levar em consideração que ainda que a fixação da pulsão parcial no circuito primário de satisfação esteja presente tanto na neurose, quanto na perversão, as pulsões parciais (libidinais) designam uma geografia dos prazeres erógenos do corpo.

Tudo isso para falar de "Ata-me". E se você não entendeu nada, por favor, sente-se aqui ao meu lado.

Por essas e outras, estou à beira de um ataque de nervos e prestes a me tornar um ludita vernacular.

Pensando na tal revolução

Howard Dean retirou sua candidatura ontem. É o fim da corrida para ele, o que indica que o candidato democrata quase certamente será John Kerry. Segundo todos os indícios, Kerry é uma espécie de Bush recauchutado. Mas é impossível que consiga ser pior que Bush. O que preocupa, agora, é que segundo algumas análises é mais fácil para Bush derrotar Kerry do que um outsider como Dean.

Recapitulando: Howard Dean é o pré-candidato a presidente democrata que utilizou de forma intensiva a internet como uma de suas principais ferramentas de campanha. Se tornou, em pouco tempo, "o candidato dos blogs". Mas seu desempenho nas primárias foi pífio, e o resultado é o anúncio de hoje.

Esse "fracasso" de Dean fez algumas pessoas apontarem "o estouro de uma nova bolha da internet": o uso de blogs em campanhas eleitorais é um fracasso.

Enterrar a importância de ferramentas da internet como weblogs em campanhas eleitorais por causa do fracasso de Dean é apressado demais. Pelo que pude entender, a internet teve muito a ver com seu crescimento e pouco com sua queda. Os erros de Dean foram políticos; talvez o mais importante deles tenha sido perder o timing, não ter percebido a hora de passar da crítica destrutiva a Bush para a formulação de propostas consistentes. E não se pode esquecer que, por ser a mais visível e a mais radical, foi a candidatura que mais apanhou da TV e dos jornais. Em relação à internet talvez tenha havido o mesmo erro que já vi outras pessoas cometerem em mídias tradicionais: o insularismo, a tendência a acreditar no próprio otimismo. Mas mesmo esse erro parece ter sido mais do movimento que da coordenação do candidato. Finalmente, outro erro típico: Dean se expôs demais, cedo demais.

O fato é que algo novo começou, e Dean foi um dos principais catalizadores da novidade. Se vai adiante, ou não, talvez ainda seja cedo para dizer. Mas Lênin podia ter certeza absoluta do que aconteceria assim que ele pisasse na Estação Finlândia? Fidel tampouco sabia se ia descer a Sierra Maestra nos braços do povo ou em um caixão.

Pela primeira vez desde o surgimento da televisão, uma revolução em comunicações está acontecendo. A internet é um meio novo e de comportamento ainda imprevisível, mas é impossível negar sua importância. Ela pode ser mensurada, quando menos, pelas dezenas de milhões de dólares que a candidatura de Dean amealhou de pequenos doadores, boa parte através da Internet. Independente e retirar sua candidatura hoje, Dean mobilizou as bases democratas como nenhum outro candidato conseguiu nas últimas décadas. Isso só aconteceu graças à internet, à sua capacidade de criar e manter comunidades ativas.

E, embora seja cedo demais, já se pode avaliar algumas dessas transformações.

A primeira delas é que o uso de internet em campanhas implica uma mudança do que os universitários chamam de paradigma. Pode-se contruir não apenas uma campanha tradicional, mas um verdadeiro movimento. No caso dos Estados Unidos, pode dar a partidos tradicionais um movimento de bases que só se encontra nos partidos de esquerda, como o PT e o PCoB brasileiros.

Isso cria um novo problema, no entanto. A internet força uma descentralização em campanhas jamais vista. Ainda não dá para entender totalmente esse novo panorama -- é muito cedo -- mas as mudanças serão definitivas. Uma campanha eleitoral, por definição, precisa ser centralizada e ter uma estratégia definida. É o que evita que um idiota descontente cause algum dano ao externar suas opiniões, como Dave Winer fez com Dean logo após a primária de Iowa. Essa descentralização forçada, ainda que relativa e passível de ser minimamente controlada, modifica totalmente o modo de comandar uma campanha, e exige que se adote uma nova atitude relativa à forma como ela caminha. É um problema grande para quem tem que administrar uma campanha.

Mas Marx dizia que um problema só surge quando já existe a solução.

Para esse tipo de campanha funcionar, é preciso que se esteja preparado para um fluxo de informações que não se pode controlar totalmente. E isso é um grande avanço; no que diz respeito ao marketing político, é uma revolução. Ao mesmo tempo, o poder multiplicador da internet entre formadores de opinião é algo que não se consegue com simples programas e comerciais de TV. Será mais fácil transformar eleitores em agentes, envolvê-los na campanha -- em suma, construir um movimento horizontal, e não vertical.

Esse é um bom começo.

quarta-feira, fevereiro 18, 2004

Constatação

Cheguei à conclusão de que, já que vou passar mais tempo que o normal em Aracaju, preciso arranjar uma namorada com carro. Alguém tem que me levar aos lugares aonde preciso ir.

Alguém conhece alguma sergipana gostosinha, bonitinha, com carro, disponibilidade absoluta de tempo, disposição para ficar esperando horas e horas e que não conheça o meu passado?

Roda mundo

Sabe quando você está ficando velho?

É quando as coisas que lhe circundavam na infância desaparecem sem deixar vestígio.

Antigamente os barbeiros ofereciam graciosamente a seus clientes a possibilidade de leitura de revistas Manchete, com seus lampejos fotográficos de um mundo que ficava cada vez menor e mais familiar.

Morreu a Manchete e morreram os barbeiros.

E as Caras que se lêem nos cabeleireiros mostram outro mundo e outros interesses, menores, mais mundanos, mais fúteis.

Como não acreditar em Deus

Autoridades educacionais britânicas estão planejando o ensino do ateísmo nas aulas de religião.

Deve ser a primeira vez que se ensina conscientemente "não-conteúdo" em escolas. Daqui a pouco vão estar ensinando silêncio nas aulas de inglês.

Isso só podia vir do mesmo lugar que solta aquelas pesquisas sobre o id das baratas.

terça-feira, fevereiro 17, 2004

Ficção científica

Dia desses fui parar no site de um escritor de ficção científica chamado Terry Bisson. E acabei lendo um de seus contos, They're made out of meat.

O conto é uma delícia. Tão engraçado, e tão interessante, que achei que mais gente gostaria de conhecê-lo. Pedi autorização ao autor para fazer a tradução e postar aqui, e ele foi gentil o bastante para permitir.

Há muitos outros contos no site de Bisson, e valem a pena por uma olhada.

Com vocês, Terry Bisson.

Eles são feitos de carne

"Eles são feitos de carne."

"Carne?"

"Carne. Eles são feitos de carne."

"Carne?"

"Não há dúvida. Selecionamos vários, de várias partes do planeta, os trouxemos a bordo de nossas naves de reconhecimento, e os testamos de todas as maneiras possíveis. Eles são completamente carne."

"Impossível. E os sinais de rádio? As mensagens para as estrelas?"

"Eles usam as ondas de rádio para conversar, mas os sinais não vêm deles. Os sinais vêm de máquinas."

"Então, quem construiu as máquinas? São esses que queremos contactar."

"Eles construíram as máquinas. É o que estou tentando dizer. Carne construiu máquinas."

"Ridículo. Como pode, carne construindo máquinas? Você está me pedindo para acreditar em carne inteligente."

"Eu não estou pedindo, eu estou dizendo. Essas criaturas são a única raça inteligente naquele setor, e elas são feitas de carne."

"Talvez sejam como os orfolei. Sabe como é, uma inteligência baseada em carbono que passa por uma fase de carne."

"Não. Eles nascem carne e morrem carne. Nós os estudamos por várias de suas fases de vida, o que não demorou muito. Tem idéia do que é a expectativa de vida de carne?"

"Me poupe. Certo, talvez eles sejam apenas parte carne. Sabe, como os weddilei. Uma cabeça de carne com um cérebro de plasma de elétrons dentro."

"Não. Nós pensamos nisso, já que eles têm cabeças de carne, como os weddilei. Mas eu falei, nós os testamos. Eles são completamente carne."

"Não têm cérebro?"

"Ah, eles têm cérebro, sim. Só que é feito de carne! É o que venho tentando dizer a você".

"Mas... Como eles pensam, então?"

"Você ainda não entendeu, não é? Está se recusando a aceitar o que eu digo. O cérebro é quem pensa. A carne."

"Carne pensante! Você está me pedindo para acreditar em carne que pensa!"

"Isso, carne que pensa! Carne com consciência! Carne que ama. Carne que sonha. A carne é a questão! Você começou a perceber a situação ou vou ter que começar tudo de novo?"

"Aimeudeus. Você está falando sério. Eles são feitos de carne."

"Obrigado. Finalmente. É, eles são feitos de carne. E vêm tentando entrar em contato conosco por quase 100 de seus anos."

"Aimeudeus. E o que essa carne tem em mente?"

"Primeiro, falar conosco. Depois imagino que queiram explorar o Universo, contactar outras inteligências, trocar idéias e informação. O de sempre."

"Quer dizer que devemos falar com carne."

"É essa a idéia. É a mensagem que vêm nos mandando pelo rádio. 'Olá. Tem alguém aí? Alguém em casa?' Esse tipo de coisa."

"Então eles falam. Eles usam palavras, idéias, conceitos?"

"Ah, sim. Só que fazem isso com carne."

"Pensei que você tivesse acabado de dizer que eles usavam o rádio."

"Usam, mas o que você acha que está no rádio? Sons de carne. Sabe quando você bate em carne e ela faz um barulho? Eles falam batendo uma carne na outra. Eles até mesmo podem cantar soprando ar através de sua carne."

"Aimeudeus. Carne cantora. Isso é demais para mim. O que você aconselha?"

"Oficialmente ou extra-oficialmente?"

"Ambos."

"Oficialmente nós somos obrigados a contactar, dar as boas vindas e cadastrar todas as raças inteligentes ou multiseres neste quadrante do Universo, sem preconceito, medo ou favorecimento. Extra-oficialmente, recomendo que a gente apague os registros e esqueça esse episódio."

"Eu torcia para que você dissesse isso."

"Parece duro demais, mas para tudo há um limite. Será que realmente queremos fazer contato com carne?"

"Concordo 100 por cento. O que é que a gente ia dizer? 'Oi, carne. Tudo bem?' Mas será que isso vai funcionar? De quantos planetas estamos falando?"

"Só um. Eles podem viajar para outros planetas em uns contêiners de carne especiais, mas não podem viver neles. E, sendo carne, só podem viajar através do espaço C. Isso os limita à velocidade da luz e torna a possibilidade de algum dia fazerem contato extremamente baixa. Infinitesimal, na verdade."

"Então vamos só fingir para eles que não há ninguém no Universo."

"Isso mesmo."

"Cruel. Mas você mesmo disse, quem quer encontrar carne? E aqueles que estiveram em nossas naves, aqueles que você testou? Tem certeza de que eles não se lembrarão?"

"Eles serão considerados malucos se lembrarem. Entramos em suas cabeças e suavizamos sua carne; somos apenas um sonho para eles."

"Um sonho de carne! Isso é tão estranhamente apropriado: nós, um sonho de carne."

"E marcamos todo o setor como desocupado."

"Bom trabalho. De acordo, oficialmente e extra-oficialmente. Caso encerrado. Mais algum? Alguém interessante daquele lado da galáxia?"

"Sim, um núcleo de hidrogênio meio tímido, mas muito agradável, em uma estrela de nona classe na zona G445. Manteve contato duas rotações galácticas atrás, e quer voltar a manter relações novamente."

"Eles sempre aparecem."

"E por que não? Imagine como o Universo seria insuportavelmente, intoleravelmente frio se alguém estivesse completamente sozinho..."

© Terry Bisson

segunda-feira, fevereiro 16, 2004

Jogo dos sete erros

Achei num MD alguns spots de rádio que fiz quando morava no Ceará. São de épocas diferentes: há um espaço de um ano entre este e este. Acontece que, quando criei um deles, eu já não agüentava mais escrever esses comerciais e me preparava para dar no pé, e isso se refletiu de forma trágica na peça. Alguém consegue adivinhar qual o spot feito de má vontade?

domingo, fevereiro 15, 2004

Rafael, o popular

Indo jantar às duas da manhã com um amigo, que por acaso é político, prestei atenção ao modo como as pessoas me tratam.

Eu nunca recebo tantos cumprimentos excessivamente efusivos de gente que nunca vi antes quanto nessas horas.

Parece que o hábito de tratar bem quem tem algum poder é extensivo aos agregados. Se me vissem na rua sequer olhariam para mim -- tá, olhariam para pensar "que gordinho lindo e sexy!" enquanto salivavam. Mas como estou ao lado do sujeito, e ele está numa posição em que deve ser cumprimentado, conseqüentemente passo a merecer a extensão desses cumprimentos. Certo, eles não me conhecem, nunca me viram mais gordo -- mas vai que eu seja alguém, e aí? Com essas coisas não se brinca, e civilidade nunca é demais.

Mas que é uma bruta perda de tempo e de sorriso, ah, isso é.

Por que eu sou metido

Chique eu sempre fui, mas agora estou mais ainda.

Um post meu foi parar no Tiro e Queda.

Ready-made art

Encontrando gente que não vejo há muito tempo.

Parece que todo mundo combinou dizer a mesma coisa quando me vê.

-- Caralho, como você tá gordo!

Mas a esses já tenho resposta pronta, lida numa camisa.

-- É, mas eu posso emagrecer. E você, que é feio?

Não, não é grosseria. Grosseria seria dizer o que realmente me vem à cabeça.

Sapiosexualmente falando

Do Amorous Propensities:

The latest coinage for sexual preference that I've run across. I'm sure there are hundreds but I'm in no rush, might as well enjoy or mock each one in its own time.

Sapiosexual people are attracted to intelligence. A laudable orientation but sounds hard to live up to. I enjoy and admire intelligence; sadly that hasn't shaped my sexuality. If anything I have a weakness for silly guys. Intelligent eyes are arousing, especially in a woman.

If sapiosexuality were the norm we'd be a happier race. But I suspect the sapiosexual will always remain a minority.


Pois é. Enquanto isso, alheio a esse papo cabeça, o troglodita aqui ainda acha que quem come cabeça é aneurisma.

sexta-feira, fevereiro 13, 2004

Mas fico com o disco do Pixinguinha, sim?

O mundinho fashion está em polvorosa.

Barbie e Ken estão se separando. Dá para acreditar? Barbie e Ken estão se separando.

É. Depois de 43 anos, cada um deles pegou seus paninhos de bunda e saíram em busca de novos horizontes e novos amores. A Barbie, recém-separada, anda pela Califórnia de biquíni e shortinho, bronzeadérrima, se fretando para o primeiro surfista que aparecer. Dizem até que anda fumando maconha com uns skatistas de Venice Beach. O Ken, coitado, ronda os bares enchendo a cara e afogando as mágoas -- "tornei-me um ébrio, na bebida busco esquecer / aquela ingrata que eu amava e que me abandonou..."

Isso vai dar Caras na semana que vem, tenho certeza. Vai ser um auê. Daqui a pouco vocês vão ver a Barbie fazendo safadeza com o Luciano Huck e o Ken pegando a Deborah Secco, depois a Wanessa Camargo, depois a Danielle Winits, até chegar ao ponto de ter que se virar com uma menina qualquer de um Big Brother qualquer.

O gerente de negócios do casal, Russell Arons, insinuou que eles romperam porque o Ken não queria se casar. Já tem gente dizendo que o Ken é gay e que tudo aquilo era fachada. Inveja, sabe como é.

Mas quer que eu fale a verdade? Pois bem: a verdade é que a Barbie é uma puta sem vergonha. Se vende a cada 3 segundos -- nem sei como a pobrezinha agüenta. E se vende barato, 60 a 80 reais; ela não se respeita. Que não venham colocar a culpa no pobre Ken, porque ele aturou muito daquela magrela sem sal. Eu mesmo já vi a Barbie fazendo coisas de que até Deus duvida.

Este mundo está virando uma pouca vergonha. Os valores familiares se esboroam ante o altar do pecado. Onde vamos parar? Cadê o Plínio Corrêa para nos redimir?

Bleargher

Eu sou assinante da Globo.com -- era o provedor mais barato a oferecer algo quando assinei o Velox, e já que por essa lei estúpida sou obrigado a pagar duas vezes por um mesmo serviço, que fosse a Globo. Pelo menos eu poderia assistir ao Globonews no computador. Além disso, tenho uma antipatia imorredoura pelo UOL.

Portanto, as mudanças no Kit.net (onde mantenho aquela listinha boba de filmes) e no Blogger pouco ou nada me afetaram. Embora eu ache que quebras de contrato são, pelo menos do ponto de vista ético, injustificáveis, eu fico calado -- como dizia um tio-avô meu, "quem tá no bom tá calado, quem tá no ruim tá danado".

Mas eu, sinceramente, queria saber o que há nesses dois serviços que justifique o fato de alguém pagar por eles.

Como hospedagem o Kit.net não conta. Não oferece absolutamente nada, além de espaço ínfimo e serviços que estão entre os piores oferecidos por aí. Se isso era admissível quando o serviço era gratuito, agora que ele é indiretamente pago passa a ser um ultraje.

O Blogger.br, por sua vez, está alguns anos atrasado em relação ao Blogger americano. Curiosamente, o Blogger é gratuito e democrático -- enquanto o Blogger.br, na prática, está aos poucos se tornando um serviço pago e restrito. Tudo isso sem oferecer algumas coisas que o Blogger americano oferece -- títulos e Atom, entre outros.

Prometeram mudanças nos dois serviços, mas até agora eu não vi absolutamente nada.

Pior: o Blogger resolveu fechar ainda mais o cerco, limitando o espaço para cada blog. Se seguir o exemplo do Kit.net, é o início do fim para os bloggers que não são usuários da Globo.

O mais curioso em tudo isso que a Globo vai na contramão dos serviços de weblogging. Praticamente todos eles são gratuitos. Há uma revolução acontecendo, e blogs (ou seja lá o nome que se dê às novas ferramentas de distribuição de informações) são parte importante nisso. Mas a Globo se esforça em alienar todos aqueles que poderiam vir a se tornar peças importantes nessa revolução.

(Uma sugestão aos bloggers que não estiverem dispostos a pagar à Globo: um serviço de hospedagem decente -- com MySQL e Perl e pelo menos 100 MB de espaço -- pode custar até menos da metade do que a Globo está cobrando. O Movable Type é uma ferramenta de blogging gratuita. E é muito, muito superior ao Blogger em recursos. Pensem nisso.)

Também estrelando

Eu sinto uma imensa pena quando leio os créditos de um filme, qualquer filme.

É quando rolam tela acima os nomes dos atores secundários, aqueles que fazem pequenos papéis. Não me refiro aos extras, multidão informe sem passado ou futuro, mas àqueles cujos nomes aparecem em décimo quinto, em vigésimo lugar. Sempre presto atenção aos créditos em filmes antigos. Dificilmente reconheço algum daqueles nomes; e raramente os vejo mais que uma vez.

Para todos eles, aquele pequeno papel deve ter significado um sopro de esperança. Depois de anos lutando por um lugar ao sol, eles finalmente conseguiram. Pode ser apenas uma fala; é mais do que conseguiram até então.

Infelizmente, geralmente é também mais do que conseguirão a partir dali.

O que deveria ser o ponto de partida para uma carreira brilhante, na maior parte das vezes, é apenas o ápice de uma trajetória que jamais irá a lugar algum. Para a maior parte, Hollywood jamais oferecerá mais que aquilo. Continuarão servindo mesas enquanto esperam por uma carreira que jamais se concretizará.

Hollywood é normalmente descrita como a fábrica de sonhos, com razão. Mas há o outro lado, o lado dos sonhos destruídos, dos fracassos lentos repletos de rebates falsos. E isso é mais tragicamente humano do que qualquer conto de fadas nas telas.

Às leitoras deste blog

Generosidade, minhas senhoras, é uma virtude que lhes abrirá as portas do céu.

Tell me why

Quando o assunto é Beatles, eu normalmente sou um esnobe pernóstico. (Não que não seja nos outros, mas nesse seguramente sou mais.)

Não gosto de perder tempo com análises dos outros, normalmente falhas e incompletas. Prefiro me ater às fontes originais e tirar minhas próprias conclusões -- que modéstia à parte são muito boas. Portanto, quando me deparo com uma dessas peças, eu me afasto torcendo o nariz.

Mas esta análise de Charles Paul Freund é uma das melhores que vi nos últimos tempos, situando acertadamente os Beatles em seu tempo e ajudando a acabar com alguns mitos, a maioria favoráveis aos Fab Four; acima de tudo, coloca os Beatles como uma banda pop, muito mais que uma banda de rock.

E se é que se pode tirar alguma conclusão do que Freund diz, é que se John Lennon foi fundamental para a aura que os Beatles sempre tiveram, as qualidades e defeitos de McCartney é que dão à música dos Beatles o cerne de uma permanência que, até agora, parece eterna.

O elo perdido

Uma das questões que sempre me intrigaram em relação aos Beatles era como eles conseguiam aquela sonoridade em seus discos. Mesmo trabalhando em um estúdio inferior, o resultado é maravilhoso, e uma das razões para eles se manterem atuais.

Há várias explicações, mas nenhuma realmente completa. Vários outros estúdios tinham grandes produtores, na mesma época. Esta de Geoff Emerick, engenheiro de som da maioria de seus discos, talvez seja o elo que faltava:

Stereo was late being introduced in England; we were quite behind the times. Up until Abbey Road, everything was monitored in mono through one loudspeaker. Which was hard, but it also helped. Because it's easy to get distinctive sounds between guitars if you've got them left and right. But if they're coming from one sound speaker, they merge together, and it's a fight to find a place and a tone and an echo for each guitar. And then, of course, when you got it and you switched to stereo, it was wonderful. It's still a good way of putting sounds together.

quinta-feira, fevereiro 12, 2004

Mais do mesmo

Quando a AOL comprou a Time Warner, revistas e jornais -- e principalmente websites, claro -- em todo o mundo apontaram a hegemonia do mundo "pontocom" sobre a velha ordem estabelecida, a vitória do novo sobre o velho.

Na época eu me interessava muito por isso, por estar envolvido com o lançamento de uma dessas empresas.

Eu via as coisas de maneira diferente. Para mim, aquele era o início do fim daquela onda de euforia. O que a compra da Time Warner me indicava era justamente o contrário do que eu lia nas revistas: era claramente o esgotamento de um modelo que me parecia carente de substância. Ao comprar a Time Warner, a AOL admitia que aquele modelo de negócios não era nada sem conteúdo.

O crash das empresas pontocom, menos de um ano depois, confirmou as minhas suspeitas.

E com a Comcast anunciando sua intenção de comprar a Disney, o New York Times de hoje traz esta manchete: Disney Deal Suggests Content Is No Longer King.

De vez em quando perco toda a esperança e penso que as pessoas simplesmente não aprendem.

Então deixa só eu recapitular as coisas para esses egressos do Instituto Benjamin Constant: distribuição sem conteúdo não é nada. Há uma hierarquia básica nas coisas do mundo. Eu preciso aprender a andar antes de aprender a correr. Eu posso criar algo e não ter como distribuir. Mas não posso distribuir o que não existe.

A propósito, recentemente a Time Warner tirou o AOL do seu nome.

Eu falo, tu fales, ele fale, eles falem

Eu adoro verbos defectivos.

Esses verbos dizem muito sobre como vemos o mundo, como aceitamos ou distorcemos a realidade.

O verbo falir, por exemplo. No presente do indicativo ele só tem duas conjugações, na primeira e segunda pessoas do plural. Isso quer dizer nós podemos falir neste momento, e então o fracasso pode ser admitido por ter vários pais; mas eu, sozinho, não posso.

A falência deve ser plural, nunca singular. É como gostaríamos que fosse. Porque a verdade, infelizmente, é justamente o contrário.

Nostalgia da sacanagem

Não sei se estou há muito tempo longe do mundo, mas nos últimos dias uma enxurrada de pessoas vêm parar aqui procurando pelo velho e bom Sady Baby.

Alguém pode me explicar o que está acontecendo? Por que o interesse repentino nesse monstro da produção cinematográfica nacional? Não é possível que seja uma onda de nostalgia em relação à putaria d'antanho.

©

Alguém quer saber a que ponto chegou o absurdo das leis de direitos autorais?

É só pegar a segunda faixa de The Whitey Album, de uma banda chamada Ciccone Youth (a qual nunca vi ou ouvi mais magra, mais gorda ou mais parecida com Madonna Louise).

Você pode baixá-la no iTunes, pagando 99 centavos de dólar. Naturalmente ela é protegida por todo aquele aparato de garantia de direitos autorais -- o que quer dizer que você não pode copiá-la ou quebrar a proteção que impede regravações.

Ela é como qualquer outra faixa que você baixa nesses serviços de venda de música online.

O único detalhe curioso é que a faixa é composta de um minuto e três segundos do mais profundo, absoluto e inconfundível silêncio.

quarta-feira, fevereiro 11, 2004

Olhai os lírios do campo

Sei lá por quê, mas lembrei de um colega de faculdade.

Era novembro de 1994. Tinha acabado de terminar uma campanha e voltado à universidade. Foi lá que encontrei um amigo, um grande câmera. Tiramos o fim da manhã e a tarde para beber e conversar. E então ele me chamou para ir ao restaurante de uma amiga.

Funcionava num lugar simples -- aquele "simples" que a gente usa como eufemismo para pobre em dinheiro e pobre em horizontes --, restaurante e residência ao mesmo tempo.

Fiquei sabendo a história de sua vida. Abandonada pelo marido, teve que fazer das tripas coração para sustentar os filhos. Era uma história de luta e de esforço. O tipo de luta que mesmo o cínico mais empedernido tem que respeitar.

Quando ela ficou sabendo que eu fazia direito na Federal, ficou empolgada e orgulhosa. Seu filho mais velho também estudava direito lá. Era meu colega. Fiquei imaginando o seu esforço em dar a melhor educação possível ao filho.

Quando o encontrei de novo, comentei que tinha ido à casa dele e conhecido sua mãe.

E então ele ficou vermelho, se pôs na defensiva, se apressou em encerrar a conversa.

Sua mãe era uma heroína, e ele tinha vergonha dela e de sua pobreza.

Patriotada

Lendo um post no Melting Pot vejo uma referência ao guaraná. Fico imaginando como é interessante que, longe do torrão natal, as pessoas passam a ter saudades de coisas nas quais prestavam pouca atenção ou às quais davam pouco valor. A maior parte das pessoas cujos relatos vejo menciona o guaraná, essa bebida brasileira que muita gente parece achar ser a maior invenção do mundo (o que não quer dizer necessariamente que o Melting Pot também ache).

Pois se eu me exilasse sentiria saudade de um monte de coisas -- menos de guaraná.

E me dedicaria, como Baudelaire numa casa de ópio, a encher a barriga com coca-cola e fingir saudades inexistentes. ;)

De como a RIAA prestou um grande favor a Bin Laden

Um comercial da RIAA mostra alguém baixando uma música no computador e, em outro lugar, uma festa animadíssima. Quando o download chega ao fim, as luzes se apagam e a música pára na tal festa. Entendeu a analogia? Inteligente, não é? Eu tenho certeza de que, ao verem o comercial, todos aqueles que baixam música na Internet vão parar imediamente de cometer tal crime, porque agora sabem download "ilegal" de música causa apagões.

De qualquer forma, Osama bin Laden está felicíssimo, porque agora já sabe como vai ser seu próximo ataque ao grande Satã. Vai precisar apenas de um computador, uma linha telefônica e o iMesh.

terça-feira, fevereiro 10, 2004

A crueldade do "Eu não pensei"

Já devo ter escrito sobre isso aqui antes: não considero ignorância desculpa para absolutamente nada. Talvez seja um pouquinho mais tolerante em relação à burrice. De qualquer forma, a maior ofensa que conheço é chamar alguém de burro. É assim que xingo a mim mesmo.

Ignorância e burrice fazem mais mal ao mundo do que a maior parte dos canalhas e maus caracteres. São responsáveis pela injustiça, pela falta de beleza, por tudo o que me incomoda no mundo.

A frase que encima este post foi lida em algum livro há mais de 20 anos, cujo título não consigo lembrar. A mim serve como alerta, sempre.

É a ignorância que faz os homens da África acharem que curarão a Aids que os consome se fizerem sexo com uma virgem, assim como brasileiros achavam que o mesmo os curaria de suas sífilis e gonorréias.

Talvez os possamos desculpar pela ignorância e pela falta de raciocínio. Esperemos apenas que as jovens que contraem Aids em sua primeira relação sexual, a maioria apenas crianças, os desculpem também.

Não tô entendeindo

No cinema, assistindo a "Revelações" -- um bom filme com Anthony Hopkins e Nicole Kidman.

Atrás de mim um grupo de moças, de seus 20 e poucos anos, conversa. Uma delas, mal educada ao extremo, fala alto demais. Fico sabendo que seu sonho, por enquanto, é casar com um médico.

Irritado, me viro e lembro a ela que falando alto daquele jeito não conseguiria casar com nenhum médico.

Quando o filme acaba a moça que fala alto exclama: "Eu não entendi nada".

E então fico com vergonha por ela, ao mesmo tempo em que penso que, se falasse menos e prestasse mais atenção ao filme, ela talvez conseguisse entender alguma coisa.

Blogs em quadrinhos

Neil Gaiman é o autor de Sandman. Mark Evanier é o roteirista de Groo, o Errante. Ambos são brilhantes.

Ambos têm blogs.

segunda-feira, fevereiro 09, 2004

A segunda Guerra de Tróia

As peças que a História nos prega. Não há nada mais cruel que ela.

Eu devia ter uns 8 ou 9 anos. Estava em férias na casa de minha avó e acabei dando de cara com um livro, provavelmente de alguma enciclopédia para jovens, que falava da descoberta de Tróia por Heinrich Schliemann. A partir desse dia Tróia me fascinou, a ponto de na pré-adolescência eu pensar seriamente em me tornar arqueólogo.

E uma das perdas que mais doíam em mim era a do tesouro de Príamo em 1936. Era terrível imaginar que aquele tesouro, conservado sob a terra durante séculos e séculos, de repente tivesse sido perdido por obra humana.

Toda a minha infância e adolescência foram passadas nessa crença.

E então, quando eu já tenho mais o que fazer, quando a única história que me interessa realmente é a minha, eis que em 98, acho, chega a revelação de que o tesouro tinha sido confiscado por Hitler e saqueado pela União Soviética. Para quem se interessar, atualmente esse tesouro está em exibição no Museu Púchkin, em Moscou, e é objeto de uma disputa diplomática entre Turquia, Alemanha e Rússia.

Não gosto que mexam no meu passado. Com o tempo me acostumei à idéia, e consegui ver nessa perda um certo lirismo fatalista. O reaparecimento do tesouro de Príamo era quase como uma segunda Guerra de Tróia, perdida como foi a primeira, quando achei que o tesouro estava desaparecido.

Por que eles ousam acabar com minhas crenças de infância?

Primeiro Papai Noel, depois Rock Hudson, e agora isso.

Tamanho não é documento

David Reutens, da Universidade de Melbourne, divulga o resultado de uma pesquisa em que defende que a intensidade sexual de uma pessoa é proporcional ao tamanho de sua amígdala.

E vocês, otários, pensando que era outro tamanho que importava.

A propósito: a Austrália faz parte da Commonwealth britânica. Portanto, essa pesquisa não é nenhuma surpresa.

Como desagradar a gregos e troianos

De vez em quando penso em mudar o nome deste blog para Macondo, pelos tantos Aurelianos pedófilos e Arcadios incestuosos que vêm equivocadamente bater aqui, à procura de algo que infelizmente não posso oferecer.

Felizmente, embora possa não parecer, além dos bobos cujas buscas insensatas os fazem dar a esta praia, o blog atrai gente que tem interesse em coisas sérias:

capa original do livro manifesto comunista

hannah arendt

manual da maquina de escrever royal

puritanismo em alice no pais das maravilhas

"Iara Iavelberg"

FALO ESPANHOL CAVALO ALEMAO MULHERES ITALIANO DEUS HOMENS

roma nero cristãos "arqui"

coliseu cenario dos primeiros martirios de cristaos

fotos cavalos Bretões

fotos de leões tiradas por larousse

Ulysses trecho

gore vidal livro caligula

tourada espetaculo trabalho infantil

Seriados americanos de cinema das décadas 40 e 50

Vésperas + Rachmaninoff

o escritor frank gruber

"lee falk" fantasma brasil lançados

comentários CONAR direito

"Embraer X Bombardier" 2004

Livro+Branding um manual para você criar, gerenciar e avaliar marcas

historias da cidade de morro do chapeu no seculo xviii na bahia

montesquieu


Se me divirto ao ver os tarados quebrando a cara aqui, quando percebem que o blog não tem muito a oferecer, ver o mesmo acontecer a essas pessoas mais sérias me deixa triste. Infelizmente, como os bobos, os sérios também não encontram aqui o que procuram.

E eu, que não gosto de Drummond, sou obrigado a concordar com aquele chato: ainda pego o anjo torto que me mandou ser gauche na vida.

domingo, fevereiro 08, 2004

Diálogo rápido e instrutivo no MSN Messenger

Fulano diz:
lindo vc na foto

Fulano diz:
tá ruim demais veio :)

Rafael diz:
Eu sou lindo, mas não é pro seu bico, baitola. :)

Fulano diz:
hahahhahhahaha

Fulano diz:
pensei que vc tinha saido nas cajuranas hoje

Rafael diz:
Nao, eu não queria ofuscar o seu brilho. :)

Rafael diz:
Qual sua fantasia?

Fulano diz:
hahhaa

Rafael diz:
"Esplendor de Serigy em noite de lua cheia"?

Fulano diz:
eu saio todo ano veio

(...)

Fulano diz:
vou sair não sou um cara sério

Fulano diz:
hehehe

Fulano diz:
noivo hehehe

Rafael diz:
Sério?

Rafael diz:
Quem é o felizardo?

Rafael diz:
Ele é um homem direito, de bem?

Rafael diz:
Ele não bate em você, né?

Fulano diz:
hahahaa


Duvido que a noiva dele gostasse de mim.

(Glossário: Cajuranas é um bloco carnalesco com de homens vestidos de mulher, nos moldes das Muquiranas de Salvador.)

Em algum lugar do passado

O que vem a seguir não é exatamente um post, e sim um comentário deixado em Prints the Chaff.

Tenho procurado minha velha e queridíssima amiga por quase 30 anos. (...)

Com meus botões eu a imaginava casada, com filhos, e talvez morando em uma bela casa, em algum lugar. Em vez disso eu tive a maior decepção de minha vida. Minha amiga estava morando como uma sem-teto nas ruas de São Francisco. (...)

Poderia acontecer a qualquer um. Nem em meus sonhos mais delirantes jamais imaginei minha amiga como uma viciada sem-teto empurrando um carrinho, segurando um cartaz pedindo dinheiro, portando HIV e tudo o que mais que vem com essa "Doença dos Sem-Teto". Chamo assim porque é como vejo -- uma doença. (...)

Só mais uma coisa: minha amiga, que agora vaga por São Francisco, estava a caminho da competição de ginástica nas Olimpíadas, e era também uma grande líder de torcida, era muito bonita, mascote da equipe de animadoras de torcidas, líder de classe e muito mais. A Doença dos Sem-Teto não discrima.


Como dizia Tom Wolfe, você não pode voltar para casa.

Eastern Standard Tribe

Cory Doctorow é um escritor de ficção científica. Seu segundo livro, Eastern Standard Tribe, foi lançado essa semana, e pode ser comprado na Amazon.

Mas além disso, o livro pode ser baixado gratuitamente aqui, no blog deste seu criado.

Não, eu não estou roubando Doctorow, nem pirateando o seu trabalho. Ele lançou seu livro com uma licença da Creative Commons, uma tentativa de atualizar o sistema de copyright a um mundo totalmente diferente. Isso quer dizer que qualquer pessoa pode baixar e ler o seu livro. É uma experiência muito interessante, que vale a pena acompanhar e que até agora deu certo, como as vendas do seu primeiro livro podem atestar.

No site de Doctorow, se alguém se interessa, está uma justificativa de suas razões para liberar o livro, e um debate interessante sobre direitos autorais.

História e Hollywood

Assistindo de novo a "Viva Zapata!", filme de 1952. Tinha tudo para ser maravilhoso: dirigido por Elia Kazan, escrito por John Steinbeck e estrelado por Marlon Brando e Anthony Quinn.

Mas eu não gosto do filme, não gosto sequer da atuação de Brando: o filme vale a pena apenas pelo desempenho de Quinn. E agora ele me deixou pensando em mais uma daquelas tantas coisas que me enchem o saco.

"Viva Zapata" é um amontoado de inverdades históricas. Retrata Zapata como um analfabeto miserável e carismático, cria uma imagem voluntarista para a Revolução Mexicana. A verdade é que Zapata nunca foi pobre (nunca foi rico, entretanto), e foi bastante influenciado pelo anarquismo. Sua ação política, se radical em suas reivindicações de reforma agrária e táticas utilizadas, foi conseqüente e até inteligente.

O ruim em aprender história com os professores de Hollywood é que se tem, sempre, uma imagem falsa do que é a história. Não apenas por causa da "licença poética", mas também porque eles se esforçam em transmitir uma imagem individualista de fenômenos históricos, normalmente com um viés imperialista.

Sem contar quando resolvem simplesmente jogar estrume na história. Eu, por exemplo, saí do cinema após ver "Gladiador" nauseado por ver aquela Roma que parece ter saído de um cenário de "Guerra nas Estrelas" e pelo desprezo com que trataram a história.

Mesmo assim estou esperando para ver "Tróia". Uma das cenas do trailer, com centenas de trirremes singrando o Egeu em direção a Tróia, é uma palhaçada megalomaníaca; e os muros da cidade não parecem ter nenhuma relação com as ruínas que Schliemann descobriu. Mas eu sou que nem mulher de malandro, fazer o quê?

E, infelizmente, eu conheço gente demais que aprendeu história com esses filmes.

sábado, fevereiro 07, 2004

Molecagem

Alguém avisa:

-- Olha o Otávio Mesquita!

Muito tarde, e de saco cheio -- é, boca livre também enche o saco depois de certo tempo.

Eu grito:

-- Amaury Júnior! Amaury Júnior!

Ele ainda olha para ver quem é o filho da puta que está gritando. Parece ser gente boa.

Acho que é algo na água de Aracaju que me faz voltar à adolescência e me força a fazer essas coisas.

Uma ajuda

De cima do camarote onde estou voam latas de cerveja e refrigerante para a rua.

É a colaboração de cada um. As latas fazem a alegria dos catadores, que olham esperançosos para cima à espera de mais latas, que serão amassadas e colocadas em um saco.

É um indício da cordialidade do brasileiro, da vontade de ajudar os menos afortunados?

Talvez. Talvez não. Eu, sinceramente, não sei.

Pergunta

Lá estou eu, num camarote assistindo ao Pré-Caju -- um carnaval fora de época em Sergipe.

Em vez de aproveitar a boca livre, uma questão me intriga.

Se esportes são a sublimação do instinto de agressão do homem, o que é o carnaval?

sexta-feira, fevereiro 06, 2004

Extra, extra

Notícias estranhas que cabem certinho em um blog esquisito:

***

Um aposentado inglês morou por um ano e meio com seu irmão morto em um motor home.

Isso é tão inglês. Imagino um diálogo parecido com esse: "Por que o senhor não percebeu que seu irmão tinha batido as botas?" "Ele nunca me disse, sir. E eu tinha que respeitar a privacidade dele".

***

Pesquisadores ingleses (quem mais, quem mais?) descobriram o segredo dos pombos-correio: eles fazem como a gente e seguem as estradas.

Pombos-correio são mais inteligentes que os cientistas, que aventavam uma série de teorias estapafúrdias relacionadas ao sol ou ao campo magnético da Terra. E acho que eles sabem disso. Por isso cagam nas cabeças das pessoas. É desprezo.

***

Um programa escocês de rádio sobre jardinagem deu orientações interessantíssimas, a um ouvinte, sobre como cultivar a erva maldita em casa.

Aposto que o ouvinte que recebeu as preciosas dicas se chama Paul McCartney.

***

A Casa Real Norueguesa pediu desculpas oficiais a Portugal depois que o príncipe Haakon disse ao presidente lusitano, Jorge Sampaio, que o seu país ficava no mar Mediterrâneo.

Imagino o pobre Sampaio coçando a cabeça e exclamando: "Ora, pois! E por que ninguém me avisou, ó gajo?"

***

Eu adoro esse mundo em que vivo.

Wikipedia

Esta semana a Wikipedia alcançou a marca de 200 mil verbetes.

Quem não conhece não sabe o que está perdendo. A Wikipedia é uma enciclopédia online, gratuita e extremamente completa.

A diferença dela para as encicloplédias tradicionais, como a Britannica, é uma só: a Wikipedia está sendo construída baseada no open-source.

Ou seja, ela funciona de uma forma bem simples: todo mundo pode acrescentar um verbete -- e todo mundo pode corrigir. Com isso, se fez uma enciclopédia com um nível de acuidade excelente, em tempo que no modelo tradicional jamais seria possível.

A Wikipedia só é possível porque a internet existe e trouxe mudanças profundas na forma como se constrói e se transmite o conhecimento. O resultado do esforço comum, em que as pessoas colaboram apenas pelo desejo de compartilhar conhecimento (e às vezes pela velha e boa vontade de aparecer), atingiu na Wikipedia a perfeição. E mostra que a internet trouxe, sim, transformações importantes e provavelmente definitivas.

A reforma ortográfica

Depois daquele post sobre a bronca que levei de minha filha, procurei alguma informação sobre a reforma ortográfica que eliminou o K, o W e o Y da língua portuguesa. Não tenho certeza da data, acho que era 1946. Não achei nada, mas no Conhecimentos Gerais achei um sumário das mudanças que virão com a nova reforma:

Letras mudas - Desaparecem da língua escrita, em Portugal, o "c" e o "p" nas palavras onde não é pronunciado. Exemplos: acção, acto, actor, actual, electricidade, inspector, exacto, colectivo, direcção, abjecção, adopção, baptismo, óptimo, Egipto. Permanecem em palavras como secção, compacto, convicto, egípcio, apocalipse, rapto, óptica.

Os portugueses estão ficando mais inteligentes.

Dupla grafia - É consagrada a dupla grafia para palavras escritas e pronunciadas de maneira diferente em Portugal e no Brasil. Exemplo: aspeto, e aspecto, caracter e caráter, facto e fato, sector e setor, ceptro e cetro, amnistia e anistia, indemnizar e indenizar, dição e dicção, corruto e corrupto.

Eles falam óptica? Ceptro? Será que falam tepsão?

Dupla acentuação - É aceita a dupla acentuação para as palavras que têm acento circunflexo no Brasil e agudo em Portugal. Exemplo: bebê e bebé, bidê e bidé, crochê e croché, matinê e matiné, fêmur e fémur, ônus e ónus, tênis e ténis, Antônio e António, acadêmico e académico, anatômico e anatómico, cômodo e cómodo, efêmero e efémero.

Não é para unificar? Por que manter essa bobagem?

Acento agudo - Caem os acentos agudos nas paroxítonas que têm "ei" na sílaba tônica: assembléia, idéia, boléia, passam a assembleia, ideia, boleia.

Só tem um problema: sem o acento, eu posso passar a pronunciar boléiros. Açucaréiros.

Acento diferencial - Caem os acentos diferenciais para as palavras homófonas. Exemplo: "pára" do verbo parar e "para" preposição; "pêlo" substantivo e "pelo" contração; "pólo" substantivo e "polo" forma arcaica ou regional da contração.

E como fica uma frase como "Ele vai, para o carro, e come uma coxinha"? Ele vai para o carro ou vai parar o carro? (Tá, é implicância, eu sei.)

Acento circunflexo - Caem os circunflexos das paroxítonas terminadas em "o" duplo: abençôo, enjôo, vôo passam para abençoo, enjoo, voo.

O problema é o crescente contato com o inglês, e o hábito crescente de se ler oo como u. Mas os anglófonos que se danem.

Hífen - Permanece o hífen antes das palavras que começam com "h", como anti-higiênico, pré-histórico, anti-heróico e antes das palavras que comecem com a última letra do prefixo, como em contra-almirante, hiper-resistente, pré-escolar, anti-imperialismo. Cai, em Portugal, o hífen em palavras formadas com os prefixos "de" e "in", mesmo nas que começam por "h": desumano, desidratado, inábil, inumano.

Eles realmente escreviam des-umano? Que horror.

Trema - Desaparece totalmente o trema: lingüiça, seqüência, freqüência, qüinqüênio, passam a linguiça, sequência, frequência, quinquênio.

Devo confessar que sou um apaixonado pelo trema. Pela beleza estética, quando menos: dois pinguinhos líricos em cima do U. E ele tem uma função fundamental: deixar claro como se fala determinada palavra. Mesmo que eu nunca a tenha visto, sei como pronunciá-la por causa dele. Sei, por exemplo, que enguiçar não se pronuncia engüiçar. Como vou saber, agora? Como vou saber que qüinqüênio não se pronuncia "kinkênio"? E quinze não se pronuncia "qüinze"? Está na hora de lançarmos um movimento pela preservação do trema. Não preservam baleias? Não preservam ianomâmis? Não preservam ararinhas azuis? Preservemos o trema, portanto. A mim, pelo menos, vai fazer mais falta. E como movimentos não são nada sem um slogan idiota, eu já bolei o meu: "La Terra é Trema!". Só não sei se Visconti vai me perdoar.

Alfabeto - As letras "k", "w" e "y" passam a ser oficialmente incorporadas ao alfabeto da língua portuguesa. Os dicionários já registram essas letras; os países africanos possuem muitas palavras escritas com elas.

Nossa, eu nem sabia que essas letras existiam. Que coisa.