Rafael Galvão

Um pouco de nada, e nada de muito importante.

quarta-feira, março 03, 2004

Float like a butterfly, sting like a bee

Devo uma coisa a Mike Tyson e a David Lynch: graças a eles, passei a gostar de boxe.

Graças ao sucesso de Tyson no fim dos anos 80, a Globo passou a exibir lutas todo domingo à noite. Eu não via graça em boxe antes disso -- violento e suado demais. A idéia de agressão física, àquela altura da vida, me parecia sem sentido.

Mas em 1990 ou 1991 acabei assistindo, porque essas lutas eram exibidas antes ou depois do seriado Twin Peaks, de David Lynch. E finalmente descobri a beleza de um esporte que as pessoas com juízo classificam como estupidez.

Não demorou pouco tempo até eu deixar um pouco de lado a grande estrela do boxe, as lutas de pesos pesados. Não são minhas preferidas: são cada vez mais técnicas, com excesso de clinches e, claro, uma relativa falta de grandes lutadores. Nos pesos pesados a beleza intrínseca do boxe se perde um pouco, vítima da força física e da tática.

E há muito, muito tempo não aparece alguém capaz de flutuar como uma borboleta e picar como uma abelha.

Por outro lado, as categorias mais leves -- galo, pena, mosca, etc. -- parecem brincadeira, mosquitos brigando por uma gota de sangue.

As categorias médias superiores são o lugar onde o esporte mantém a melhor combinação de arte, técnica e força. É nessas categorias que estão lutadores maravilhosos como Roy Jones, Jr. E é onde se pode assistir às melhores lutas.

Gente como Julio Cesar Chavez, Pernell Whitaker (um dos meus preferidos graças ao deboche com que luta, ou lutava), Oscar de La Hoya foram alguns dos lutadores a que assisti e que carregavam a verdadeira chama do boxe. Porque a beleza do esporte não está exatamente num nocaute, e sim na graça e perfeição com que um corpo se move em direção ao seu objetivo. O nocaute é só o clímax. É por isso que Muhammad Ali foi o maior de todos: por combinar, com perfeição, graça e força, os dois principais elementos do boxe. Float like a butterfly, sting like a bee.

Uma paródia de Stanislaw Ponte Preta ao "If", de Kipling, publicada em "Primo Altamirando e Elas", diz que se eu gosto de boxe sou uma besta. Talvez seja. Mas tenho a leve desconfiança de que Sérgio Porto não assistiu a nenhuma luta de Muhammad Ali. E se assistiu e mesmo assim continuava achando um retrato da barbárie, a besta era ele.

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